sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Mal se foram, se mal foram, semáforam, semáforo.

Vermelho. Buzinas. Asfalto molhado. Garoa. Cidade Cinza. A fila se formava como formigas trabalhando num grande carregamento.

Logo que se aproximou, as luzes verdes foram se extinguindo, dando lugar ao alaranjado e logo após o vermelho pare. Ela estava cansada, seu dia tinha sido longo. Vestia um terninho risca de giz, que a deixava muito elegante ao mesmo tempo descontraída. Já não tinha trinta por cento da maquiagem do começo do dia. Só retocara o batom. Parada, abriu o vidro pra sentir o cheiro da sua rotina. Checou o celular e o retrovisor.

Vermelho. Buzinas. Asfalto molhado. Garoa. Cidade Cinza. Aconteceu o mesmo com ele. Logo que se aproximou proferiu um palavrão pela mudança repentina da cor. Ele estava agitado, tinha conseguido fechar um bom negócio no seu negócio. Vestia a calça de uma cor só a camisa de sempre e a gravata, que apesar de não gostar era mera formalidade. Já não tinha trinta por cento da coragem do começo do dia. Só retocara a lábia de vendedor. Parado, abriu o vidro pra não sentir o cheiro da solidão do carro. Checou o celular e o carro ao lado.

Magnetismo. Alguns chamam assim. O que aconteceu pode até ser explicado por esse fenômeno. Eu acredito mais em coincidência. Os olhares se encontraram no pedaço de asfalto que separavam os automóveis. Ela na esquerda, ele na direita da rua.

Que situação tensa. Os olhos se cumprimentaram como se conhecessem há muito tempo, velhos amigos de infância. O destino era o filme que passava em suas pupilas.

Ela o viu brincando com o cachorro no quintal da nova casa, consertando a lâmpada do banheiro, surpreendendo-a com rosas colombianas num dia inesperado. Censurando seu vestido, alugando um filme pro sábado chuvoso, a contrariando quando fosse jogar seu futebol, preparando uma salada de frutas. Viu-o ser namorado, marido, pai e avô. Ser chato, carinhoso, mesquinho, arisco, meigo, sensível, alegre e triste. Viu sua vida toda.

Ele a viu fazendo trancinhas na pequena Sofia, estragando a lâmpada do banheiro, o surpreendendo com o eu te amo sussurrado, Indicando-lhe qual gravata ficava legal, comprando litros de sorvete para o sábado chuvoso, a contrariando quando lhe dava opinião na roupa, preparando um churrasco. Viu-a ser namorada, esposa, mãe e avó. Ser meiga, ranzinza, teimosa, carinhosa, astuta, confusa, breve, alegre e triste. Viu sua vida toda.

De repente uma buzina. A olhada se quebra. Sinal Verde.
Ela vira para a esquerda, ele para a direita. Nunca mais se cruzam.

Um sinal? De que cor?

2 comentários:

  1. a maneira com que vc brinca com o titulo da mais empolgação para ler sabia?

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  2. Ah, não tinha pensado nisso, vou começar a brincar mais!
    (:

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